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Situada na região norte da América do Sul, a floresta amazônica possui uma extensão de aproximadamente 7 mil quilômetros quadrados, espalhada por territórios do Brasil, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Equador, Suriname, Guiana e Guiana Francesa. Porém, a maior parte da floresta está presente em território brasileiro (estados do Amazonas, Amapa, Rondônia, Acre, Pará e Roraima). Em função de sua biodiversidade e importância, foi apelidada de o "pulmão do mundo".

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Negociações

O que está em jogo para Amazônia nas negociações de clima

Em Copenhague, a décima quinta conferência das partes (COP-15), da Convenção de Clima, oferece as oportunidades chaves para a Amazônia, o Brasil e o mundo para interromper o trajeto atual que leve a um desastre climático. Embora os negociadores em Copenhague devam se esforçar ao máximo para chegarem a um acordo que faz esta mudança de rumo acontecer, não deveríamos ser tão inocentes para entrar em uma luta desta sem ter um “Plano B”, caso o acordo necessário não seja alcançado.

Se uma mudança real não for acordada na COP-15, então precisa fazer isto na reunião seguinte em 2010. O que não pode ser permitido acontecer é que um acordo adequado seja adiado por mais uma rodada de cinco anos de negociações, até o final do “período de compromisso” seguinte.

A proposta que o Itamaraty levou para Copenhague é, digamos, “tímida”. Mesmo assim, o mero fato que os diplomatas brasileiros estejam dispostos a discutir o lugar da floresta amazônica na luta contra o aquecimento global representa um avanço sobre a história anterior nessas negociações. A proposta brasileira feita em Copenhague é para que as florestas entrem somente se for de forma “limitada” (1), com dinheiro sendo doado a um fundo voluntário (o Fundo Amazônia) e que estas doações não sejam válidas para crédito de carbono que pode ser vendido para compensar emissões de combustíveis fósseis.

No entanto, há boas razões porque os representantes do Brasil devem pensar em assumir uma posição mais corajosa. Embora seja improvável que mudarão as suas posições no meio da conferência de Copenhague, são prováveis ter alguns meses até a reunião seguinte para repensar. Para a Amazônia e o Brasil é essencial controlar o aquecimento global em um nível que assegure a sobrevivência da floresta amazônica, e incluir a manutenção da floresta amazônica como uma opção de mitigação em uma escala que efetivamente pare a expansão do desmatamento na região. As posições de Itamaraty na COP-15 precisam mudar pelas seguintes razões:

Porque um fundo voluntário não é suficiente

Um fundo “voluntário” seria condenado a um papel muito mais secundário do que seria o caso se as reduções fossem ligadas a metas obrigatórias e válidas para crédito dentro da Convenção de Clima. Se os principais emissores industriais resolverem enfrentar de forma mais séria o desafio de conter o aquecimento global, então esses países terão que assumir compromissos de redução muito maiores. Cumprir com esses compromissos será muito caro e absorverá todo o dinheiro que esses países teriam para lutar contra o aquecimento global. Haveria pouco ou nenhum dinheiro sobrando para contribuições a fundos voluntários, essencialmente de relações públicas.

O argumento usado para relegar a Redução do Desmatamento e da Degradação (REDD) a um fundo separado, ao invés incluir a REDD no comércio de carbono como parte dos mecanismos para cumprir as metas de redução de emissões dos países, é de que a diminuição da perda das florestas tropicais representa uma quantidade tão grande de carbono que a oferta deste no mercado derrubaria o preço de cada tonelada até o ponto que ninguém investiria em tecnologias limpas nos países ricos.

Este argumento é falho, pois presume que os compromissos dos países são fixos para reduzir as suas emissões, mas a realidade é que nenhum país hoje tem compromisso alguma para qualquer quantidade específica de redução de 2013 em diante. O preço de qualquer commodity, seja soja ou carbono, depende de um equilíbrio entre a oferta e a demanda, fazendo com que o preço pode ser mantido ou aumentado tanto por diminuir a oferta como por aumentar a demanda.

A queda do preço de carbono prevista por defensores de um fundo separado, e também por defensores de um mercado mas com a oferta de carbono florestal permitida sendo muito limitada, presume que a demanda para compra de crédito de carbono permaneça constante. Mas isto é justamente esta demanda que não pode ficar constante: a batalha principal é para fazer os países assumirem compromissos muito maiores para redução das suas emissões líquidas, o que implica em aumentar em muito a demanda para compra de carbono. Não se pode jogar a toalha sobre o aumento desses compromissos antes da batalha nem começar!

Porque o crédito de carbono da floresta deve ser comercializado

Há uma grande diferença entre pagamentos ao Brasil e a outros países tropicais através de um fundo que não gera nenhum crédito de carbono, e vender o crédito em um mercado aberto. A diferença principal está no volume de dinheiro, que, como já mencionado, seria muito limitado no caso de um fundo porque a mitigação que conta para cumprir as metas negociadas absorverá quase todo o dinheiro disponível.

Uma outra razão é que um fundo separado condena países como o Brasil a níveis muito menores de retorno financeiro a partir do serviço ambiental que as suas florestas tropicais desempenham em evitar o aquecimento global, porque a quantidade paga através do fundo não está baseada no valor do carbono no mercado (ou seja, competindo com as alternativas caras nos países industrializados), mas, em vez disso, apenas pela compensação dos “custos oportunidade” de não desmatar (2).

Isto significa pagar somente pelo que seria ganho se a floresta tivesse sido cortada e convertida em pastagem de baixa produtividade, como normal ocorre na maior parte da Amazônia hoje. Mas será que aceitar isto como a base do pagamento é de interesse para o Brasil? O custo de oportunidade representa o menor retorno possível que seria aceito por um vendedor em um sistema de mercado, mas em um mercado não há limite no lado superior, a respeito de quanto pode ser ganho se a oferta e a demanda fizerem com que o preço aumente acima deste nível mínimo.

Jogar fora o potencial para um retorno muito maior é uma loucura como estratégia de negociação para o Brasil. Para fins de ilustração, imagine se em 1940, antes que a exploração do petróleo começou no Oriente Médio, se alguém for a Arábia Saudita para oferecer comprar os direitos de desenvolvimento na base do custo de oportunidade. Poderia argumentar que o uso na época, com alguns camelos no deserto produzindo um valor de dinheiro de, por exemplo, menos de dez centavos de dólar por o hectare por o ano, significasse que seriam felizes em aceitar US$10/ha para o uso da área por os cem anos seguintes. Seria sábio, ou justo, para aceitar tal negócio?

Porque os interesses do Brasil são inerentemente diferentes das da Europa

Tornou-se moda na Europa se opor a permitir que a manutenção de floresta tropical ganhe o crédito do carbono que pode ser negociado para cumprir os compromissos que países industrializados fazem para reduzir as suas emissões líquidas nacionais. Governos europeus e ONGs baseadas na Europa, como o Greenpeace internacional, tomam esta posição.

Justificam este com um discurso moral, reivindicando que os países que causaram a crise climática atual têm uma responsabilidade para mitigar as emissões “em casa”. Isto confunde duas questões muito diferentes. Uma é quem deve pagar o grosso do custo, e poucos discordariam que este deve ser os países desenvolvidos. Entretanto, é uma questão inteiramente diferente a respeito de se toda a mitigação deve ser feita “em casa”, onde o custo pode facilmente ser o dobro ou o triplo do custo para cada tonelada do carbono mantida fora da atmosfera, em comparação com o que poderia ser conseguido aplicando os mesmos fundos no exterior.

A responsabilidade para o clima não é o fator chave aqui. Para entender isto, deveríamos nos colocar no lugar de um político em um país europeu, tal como Alemanha. Imagine se um grupo de ambientalistas aparece no seu gabinete exigindo que a Alemanha gaste 10% do seu PIB na luta contra o aquecimento global. Você pôde dizer, “certo, então vamos construir uma fábrica de cataventos, uma fábrica de painéis solares, vamos reformar a fábrica de automóveis Opel para fazer carros ecológicos, etc.” Isto tudo cria emprego e renda na Alemanha. Por outro lado, se o político fosse dizer “tudo bem, vamos mandar este dinheiro para o Brasil para parar o desmatamento” isto não faria nada para a economia da Alemanha. Conseqüentemente, é natural que os Europeus se oponham a grandes remessas financeiras para evitar o desmatamento tropical, mesmo se o benefício climático for várias vezes maior pela mesma despesa em mitigação.

O problema é que restringir toda ou quase toda a mitigação aos investimentos caros “em casa” resultará nestes países não aceitarem compromissos muito grandes para reduzir as suas emissões nacionais. Essas reduções grandes são necessárias para realmente manter a temperatura global abaixo do limite de 2°C com relação aos níveis pré-industriais. Já que 2°C é aproximadamente o limite para manter a floresta amazônica, o Brasil não somente perderia as entradas financeiras oriundas da venda de carbono mas também poderia perder a própria floresta amazônica. Portanto, os interesses do Brasil são inerentemente diferentes dos da Europa.

Porque o Brasil deve assumir uma meta de verdade

O objetivo voluntário de Itamaraty para reduzir as emissões em 36,1% até 2020 (em comparação a o que é projetado a ser emitido naquele ano sem nenhuma mitigação) é, literalmente, “para inglês ver”. Um “objetivo voluntário” é muito diferente de uma “meta”. O termo “meta” implica que há conseqüências se não for cumprida, enquanto um “objetivo” não implica em nenhuma consequência deste tipo.

No caso de um acordo internacional vinculante, como o Protocolo de Kyoto, uma meta (“quantidade atribuída”) significa que se um país não cumprir sua meta teria que comprar o crédito de carbono de em algum lugar no preço vigente naquele tempo até que o alvo esteja cumprida. Sob um acordo obrigatório, o compromisso permanece em vigor, independente de quem esteja governando o país. Em contraste, entre 2009 e 2020, o Brasil terá várias administrações presidenciais, e cada um estará livre para abandonar o “objetivo voluntário” que o governo Lula fez em 2009.

Assumir uma meta de verdade sob um acordo obrigatório seria vantajoso para o Brasil para diversas razões. Primeiramente, tal alvo permitiria que muito mais crédito de carbono fosse vendido baseado na redução das emissões totais nacionais, não apenas os resultados de projetos específicos do mitigação, e ainda mais restrito à parcela da redução que pode ser mostrada para ser “adicional” a um cenário sem projeto. Em segundo, o Brasil assumir uma meta na Convenção de Clima seria uma etapa chave em induzir os países industrializados que tiveram compromissos sob o Protocolo de Kyoto para cometer agora a cortes maiores, e para induzir outros grandes países em desenvolvimento para também assumirem compromissos vinculantes sob o acordo.

O Brasil é um dos países mais vulneráveis ao impacto do aquecimento global, e, portanto, conseguir esta redução global maior é essencial ao interesse nacional brasileiro. Se não, o País arrisca perder muita ou toda a sua floresta amazônica, devido à mudança do clima.

Acredito que, mais cedo ou mais tarde, o Itamaraty vai mudar a sua resistência à assumir metas verdadeiras (i.e., não apenas um “objetivo voluntário”) e a sua resistência ao crédito de carbono verdadeiro (i.e., não apenas doações a um fundo voluntário, sem ser compensatório com relação aos combustíveis fósseis). Quanto mais cedo isto ocorrer, melhor serão as chances de evitar o pior na Amazônia.

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